sábado, 3 de setembro de 2011

DR.RODOLPHO VILHENA DE MORAIS
SOLENIDADE DE INAUGURAÇÃO
DA NOVA MATERNIDADE DA
SANTA CASA DA CAMPANHA
18/04/1975.
Para agradecer a honra que me foi conferida de paraninfar a solenidade do rejuvenescimento desta gloriosa e benemérita Santa Casa, com a reforma de sua Maternidade, lembrei-me de Olavo Bilac que, além de ter sido o primoroso poeta que todos conhecem era também fluente e magnífico orador; e, não obstante, para agradecer carinhosa recepção que lhe era feita pelos estudantes da Faculdade de Direito de São Paulo, “ao em vez de improvisar algumas palavras que, dizia o grande vate, morreriam ao nascer, preferiu escrevê-las para dar-lhes mais vida, maior calor e duração, de modo a poderem estender-se até a ouvidos distantes e almas afastadas”.
Assim também o fiz, insisto, porque os sentimentos de que me acho possuído me fazem também sentir a necessidade de estender minhas palavras aos campanhenses que por motivos compreensíveis, óbvios, não se encontram neste recinto mas que, da intimidade de seus lares e até de longínquas paragens, desejariam solidarizar-se e aplaudir os esforços da benfazeja administração que incentivou os melhoramentos para cujo festejo esta Santa Casa hoje se atavia e engalana sob a direção das caridosas irmãs de São Vicente de Paulo cuja abnegação e desapego às coisas humanas são de tal monta que nos fazem crê-las criaturas celestes antes que seres humanos.
Desejaria que todos os que me dão a honra de ouvir, avaliassem a intensidade dos sentimentos de que me acho possuído ao rever, após tão longa ausência, meu berço natal tão rico de tradições e de glórias, de civismo e cultura.
Minhas intensas saudades, porém, se enraizavam mais nos usos e costumes de nossa gente, na simplicidade e geral honradez de seus habitantes, no ambiente, no aspecto de suas ruas e moradias a cada uma das quais, com poucas exceções, se prendia à lembrança de um ou mais pacientes atendidos por mim nos anos aqui vividos, nos dramas que tive de enfrentar pela mudança de um exercício inicial da clínica em Hospitais e instituições médicas onde primeiramente trabalhei no Rio de Janeiro e nos quais sobravam os recursos indispensáveis à diagnose e tratamento dos doentes, com a falência, aqui e quase total, de todos esses elementos, o que me obrigava a não levar, rigorosamente em conta, leis e preceitos estabelecidos pelas ciências médicas e enfrentas as conseqüências daí decorrentes; sacrificar postulados de assepsia e anti-sepsia, habituado a entrar em salas onde até o ar é filtrado e operadores e auxiliares se revestem dos pés à cabeça de paramentos rigorosamente desinfetados: calças, botas, aventais, luvas, máscaras, gorros, etc. e ver-me coagido a realizar certo número de intervenções abrindo mão desses preceitos como a que pratiquei com a presença do Revmo. Pe. Natuzzi, então reitor do Noviciado dos jesuítas, no diretor da The Conquista Chicão Gold Mine Ltda., Dr. Georges Proust.
Caíra ele, quando a caminho de São Gonçalo, a frente de um trolley que servia à Companhia e que lhe passara sobre uma das pernas provocando-lhe uma fratura exposta e cominutiva. Embora médico da Companhia, encontrava-me em Alfenas à cabeceira de um doente e assim foram solicitados os serviços de dois colegas de cidades vizinhas que lhe aplicaram um aparelho gessado mas sem janelas, ao certo por não contarem com a infecção do grave ferimento, que seria fatal. Aquela época não havia aqui telégrafo nem telefone e, assim, só me foi dado chegar à cabeceira da vítima seis ou sete dias após o acidente.
Ao abrir o tal aparelho gessado, que lhe havia sido aplicado, verifiquei que esse membro estava tomado de gangrena até pouco acima da articulação do joelho.
A amputação se impunha e imediata e foi realizada num quarto da residência do operado à luz de lampiões de querosene e improvisados dois auxiliares: cloroformizador, um médico; instrumentalista, um farmacêutico.
E por que não o operei aqui mesmo na Santa Casa? O motivo já o tereis adivinhado. Por esse tempo esta Casa Santa não oferecia maior conforto que a residência do referido engenheiro.
É certo que intervenções outras fiz aqui mesmo e algumas como as que tiveram por cenário esta Maternidade como o de uma retenção placentária de uma infeliz demente que encontrei nestas condições, perambulando por uma de nossas vias públicas e o de uma retenção de feto morto três dias já passados e cuja infeliz parturiente fora trasladada para aqui em carro de boi. Mas num caso e noutro tratava-se de pacientes de extrema pobreza e gravemente infectadas. Ambas, com a graça de Deus, sobreviveram.
Voltando ao operando cujo acidente impressionara toda a cidade direi que logo de início foi ele acometido de uma síncope respiratória. Não contando com tal acidente, não tinha à mão um abridor de boca. Provido o paciente de belo cavanhaque e farta cabeleira e, agarrando naquele e nesta, consegui abrir-lhe a boca com facilidade e pinçar-lhe a língua. Com pequena ginástica respiratória tudo voltou rapidamente ao normal e pude prosseguir em minha tarefa.
Dias após, o operado foi acometido de calafrios, febre e abundante sudorese. Àquele tempo não havia a maravilhosa arma dos antibióticos. Se houvesse e dela me valesse, ter-me-ia enganado. E por que? Porque tal fenômeno se repetiu por três vezes em dias alternados, provocando-me grande susto uma vez que em nossa urbs e no sul de Minas não havia o agente nem os transmissores da malária.
O tipo de febre era inconfundivelmente o da terçã benigna. Indago meu cliente e ele me confessa haver sido acometido dessa febre, quando na África. O quinino debelou tão inesperado o azarento surto.
Eu não quis, desde logo, comunicar ao meu cliente, moço e cheio de vida, haver sido forçado a amputar-lhe a perna ao nível do terço inferior da coxa. Como o operado continuava a queixar-se de dores na perna e no pé, as chamadas dores fantasmas, apesar de seus companheiros de trabalho haverem despachado para lugar bem distante – Pirapora – o coto amputado o que eles acreditavam conjuraria tais dores, foi-me fácil mantê-lo assim enganado por alguns dias. Tudo o mais correu bem e pude dar-lhe alta curado, embora de muletas.
De regresso à Paris meu amigo Proust presenteou-me com o grande tratado de cirurgia de Brissaud-Pirard, - Reclus, que conservo até hoje e com a seguinte dedicatória: A mon ami R. Vilhena – Geroses Proust.
Não se veja nesse fato, ocorrido há tantos anos, um atraso de nossa gente e de nossa urbsporque episódio perfeitamente idêntico ocorreu 15 anos após, na próspera cidade de Passos e na mesma noite em que eu e minha fiel companheira de todos os momentos de minha vida profissional, ali chegávamos de mudança. Logo após o jantar, o honrado hospedeiro que nos acolhia, pediu-me muito constrangido para ir examinar veneranda Senhora, ligada ao mesmo por laços de parentesco e gravemente doente e acrescentando que assim o fazia com assentimento de dois colegas que a assistiam. Após breve exame verifiquei tratar-se de uma hérnia umbilical estrangulada, já passadas 24 horas e que uma intervenção se impunha e imediata. Esta a fiz com a paciente estendida sobre a mesa da sala de jantar de sua residência à luz de lampiões de querosene, como aqui, porém, 15 anos mais tarde. Com sete dias foram retirados os pontos: cicatrização per prima.
A veneranda Senhora viveu mais alguns anos. Não interessava investigar porque praticada por mim a intervenção e, não por qualquer um de seus assistentes capacitados para tanto.
Fatos como esses ocorrem e ocorrerão ainda por largos anos em nosso grande país até que o progresso possa chegar ao âmago de seu hinterland e, ainda assim, só aos grandes centros é dada a possibilidade de instalações que permitam, aos mestres, a prática da alta cirurgia dado o elevadíssimo custo da maravilhosa aparelhagem necessária.
Uma simples lâmpada para uma sala de operações, capaz de bem iluminá-la sem projetar sombras para qualquer lado, custa mil cruzeiros novos. Um tubo de Crooks ou seja uma lâmpada para um aparelho de Raios X, mais de mil!
A Campanha conhecida pelo seu amor à cultura e progresso, com a construção desta Santa Casa teve largo tempo a primazia de ser a única instituição desse gênero no sul de Minas, corroborando mais uma vez a sua conhecida alcunha de Atenas Sul Mineira.
A Campanha, cidade florescente um dia, quando da exploração de suas minas de ouro e ao tempo do braço escravo e que imperava numa área tão grande que é hoje ocupada por 15 municípios mineiros, ao tempo em que vim à luz do dia, decadente, balda de recursos, vivia apenas de suas gloriosas tradições de cultura e patriotismo às quais um de seus mais ilustres filhos – Alfredo Valadão – consagrou quatro alentados volumes sob o título de “A Campanha da Princesa”.
Hoje, os que a visitam sentem que esta cidade não se contenta mais em viver à sombra de suas glórias passadas porque tomada de um alentador dinamismo voltado para sua arquitetura, meios de transporte, vias de comunicação, estabelecimentos de ensino, sociedades culturais etc., ansiosa por volver aos seus áureos tempos de antanho, o que se dará desde que enraizada, também aqui, a indústria.
Quando, já formado, retornei a esta terra querida – há quanto tempo, meu Deus –existiam aqui três médicos que mantinham honradamente tradição que vinha de longe: não cobrar honorários médicos de seus clientes, embora minguadíssimos, senão rara e esporadicamente.
Dos milagres que cada um deles fazia para manter decentemente suas famílias não se cabe inquirir, bastando apenas lembrar que dois deles eram professores da Escola Normal, aqui existente, e a senhora do terceiro era, também, professora de uma escola primária.
Aos seus minguadíssimos ordenados é de justiça acrescentar pequeninos produtos hortigranjeiros com que os presenteavam alguns dos 95% de seus clientes pobres mas gratos e reconhecidos.
Chamavam-se esses abnegados médicos: José Braz Cesarino, Júlio Ferreira da Veiga e Francisco Honório Ferreira Brandão. Este último, logo depois, retirou-se para São Paulo, onde faleceu.
Diz-se ser perigoso passar-se perto de médico moço e muro velho: qualquer dos dois poderá desabar sobre quem se arriscar a tanto. Meus conterrâneos bem cedo perderam o medo do médico moço. Fui logo convidado para médico da companhia The Conquista Chicão Gold Mine Ltda., como já o deixei assinalado e do Colégio Sion, fundado em 1904, e sob a direção da inteligente e dinâmica Mère Dieudonnée. Minha clínica tanto e tão rapidamente se desenvolveu que, na falta de automóveis, então inexistentes, e como a época não comportava mais nem eu, dela, precisava, da cadeirinhade que se valia, em seus últimos anos de vida, o famoso cirurgião português Midões, radicado em nossa terra, onde exerceu a profissão por 50 anos, tive que apelar para uma montaria a fim de atender doentes espalhados pelos pontos mais distantes da cidade e localidades vizinhas. Ainda hoje, espero em Deus, sobrevivam muitos dos que diariamente me teriam visto cruzando esta cidade em todos os sentidos, galgando um animal que tantos serviços me prestou que quero perpetuar-lhe aqui o seu nome - Rainha –selada com selinzinho de jockey, apertado apenas com uma silha, ao contrário dos complicados apetrechos habitualmente usados. Devo confessar não ter feito escola: nunca vi alguém valendo-se do mesmo modo de arriar cavalos de sela. Após tão longa digressão volto meu pensamento para a Faculdade de Medicina para acentuar que durante o curso médico éramos obrigados a cursar todas as disciplinas do currículo como as de olhos, pele, e sífilis,mentais e nervosas. Mas independente disso, cada um se entregava mais às matérias básicas as quais se pretendia dedicar: clínica médica, cirurgia,pediatria, ginecologia, etc. Foi o que aconteceu comigo no que tange às especialidades que vão ter por cenário esta nova maternidade – que não me foi dado freqüentar com assiduidade que se faria necessária por andar embrenhado em outras clínicas até os gorgomilos e pela necessidade de trabalhar para me manter e, mais vezes, até altas horas da noite.
Assim só me foi dado acompanhar as clínicas obstétricas e ginecológicao bastante para ser aprovado como o fui, e com nota superior a que me era lícito esperar.
O que sobremodo me animava era saber que 95% dos partos ocorrem normalmente tanto que assistidos, entre nós, por aparadeiras ou curiosos e, na França, por sagefemmes, com a diferença de serem analfabetas as nossas e, das francesas, se exige freqüência de dois anos em escolas de ginecologia e obstetrícia. Mas o que não previa, era que, além dos 5% de anomalias, dentro dessa normalidade ocorrem freqüentemente pequeninos acidentes, que, não contornados transformam essa normalidade em anormalidade.
Foi o que aconteceu quando, pouco tempo após haver aqui chegado, fui chamado uma noite para atender parturiente, primípara, não muito jovem e já com algumas horas de trabalho. Bem conhecia eu o novo medicamento que vi empregado nalgumas das vezes em que andei pela enfermaria do Professor Fernando Magalhães, denominado pituitrina e tão eficaz que viria tornar quase anacrônico o emprego do fórceps, conforme dizia o mesmo professor em incontido entusiasmo.
Receitei-o e quando cuidei tê-lo em mão, criei alma nova. Sabia que, se necessário, poderia renovar a injeção e foi o que fiz uma vez que a paciente não apresentara qualquer reação com a primeira. Poucos minutos após a segunda, dormia ela tranqüilamente.
Eu, que de início, poderia duvidar que medicamento, tão recentemente lançado no mercado, fosse encontrado em pequena farmácia e tão distante dos grandes centros, não hesitei em prescrevê-lo por estar nele minha única esperança. Agora – o que deveria ter feito antes – tomando da caixa que o deveria conter e aproximando-a do lampião de querosene (sempre às voltas com os tais lampiões) leio: Trinetrinade propriedades precisamente antagônicas: antiespasmódicas, sedativas. Não encontrei outra solução que a de apelar para um colega, eventualmente na cidade e com prática da especialidade.
Poucos dias após, arrumei minha mala e voltei para o Rio a fim de freqüentar o serviço do Professor Carvalho de Azevedo que era, então, o ginecologista e parteiro de maior nomeada, só regressando ao meu torrão natal quando me senti mais seguro neste setor da medicina, pois que, nos das clínicas médica e cirúrgica muito me havia esforçado, trabalhando como interno na Santa Casa e na Beneficência Portuguesa, de onde saí com o diploma de médico assistente dessa Real e Benemérita Sociedade de Beneficência. Nesses hospitais trabalhei com os dois mais afamados Mestres de então: Professor Rocha Faria, em clínica médica e Professor Paes Leme, em clínica cirúrgica. No momento em que dedilho estas linhas tenho sob os olhos um Relatório desta Santa Casa, do qual consta haver eu, no ano de 1915, praticado aqui 49 intervenções cirúrgicas maiores e menores e 600 curativos sem um único caso letal.
Como acabei de afirmar, e como é de todos sabido, que o trabalho do parto é função normal dos organismos humanos e animais, estariam erradas aquelas senhoras que se encontrando em princípios de uma gestação e fiadas no que há pouco afirmei de ocorrerem normalmente 95% dos partos, deixassem de procurar nesta renovada Maternidade os distintos médicos que se achem à sua testa, porque tal remodelação foi feita para melhor servi-las e porque um parto pode parecer normal no início das primeiras dores e mudar de feitio no decorrer delas por motivos que não me cabe aqui especificar tal como se deu no caso que acabo de referir.
Um parto pode ainda parecer ter sido normal até a expulsão do feto, isto é, até o nascimento da criança e tal coisa não ser inteiramente verdadeira e, daí, o ser recomendável, sempre que possível, um exame ginecológico pré e postparto.
Quando aqui cheguei, logo que formado, esta Santa Casa parecida um recanto do Céu tal o número de Santas que nela se abrigavam. A frente delas a boníssima Superiora Mère Aubour de uma dedicação sem limites aos seus doentes e que era também dotada de uma ingenuidade e simplicidade verdadeiramente infantis. Seguiam-na com zelo igual e igual caridade as irmãs Gabriela e Agostinha e posteriormente as irmãs Clara e Ventura.
Essas religiosas foram trazidas para aqui pelo então Provedor Padre Paulo que tinha virtudes e caridade dignas do fundador dessa Ordem.
Nessa Corte celestial figurava ainda uma italiana – Ignez Saloti – também de uma dedicação sem par a esta Casa à qual se devotou logo após lhe haver morrido o marido que a aguardava no Céu. Cumpre ser lembrado um velhinho italiano – Pietro– que quase inválido porque portador de uma artrite coxo-femural, ainda assim, com pequenos serviços, retribuía a acolhida que aqui lhe fora dada.
Conforme já ficou assinalado, o Provedor era Monsenhor Paulo Emílio Moinhos de Vilhena que iniciara sua carreira sacerdotal em Ponte Alta onde, por largos anos, prestara relevantes serviços religiosos e caritativos à sua população que se mostrou digna dele apoiando calorosamente a mudança, por morte dele, do nome daquele arraial, hoje cidade, para o de município Monsenhor Paulo, que lá do Céu, parece não o ter esquecido como se infere do invejável surto de progresso que hoje o aviva e alenta. A seguir, e por curto lapso de tempo o Senhor Álvaro Araújo. Todos os presentes são testemunhas do esforço, tenacidade e ingente sacrifício com que Serafim de Vilhena, sucedendo ao bondoso Sr. Álvaro Araújo, tomou a seus ombros a Provedoria desta casa há 50 anos e como tem desempenhado tão difícil tarefa. Espero que não levareis a mal que eu assinale que esse apego, esse aferro a esta casa e através dela, esse empenho em servir a pobreza que aqui tem abrigo, um refúgio, é uma tradição, é um quase destino dessa família como se torna fácil mostrar.
Inaugura-se esta Santa Casa em 1851 e seu primeiro Provedor é o Major Mathias de Vilhena. A ele, muitos anos após, assim se refere o Almanach Sul Mineiro de 1884 e de propriedade do Comendador Bernardo Saturnino da Veiga:
“... julgamos um dever imperioso registrar nestas ligeiras observações um nome ilustre, o do Major Mathias Antônio Moinhos de Vilhena, tronco respeitável de uma distinta e numerosa família, relíquia veneranda da geração que se findou.
Este estimado ancião, tipo de primitivas virtudes, modelo de homem de bem, tem seu nome ligado a quase todos os melhoramentos de nossa cidade. Alma verdadeiramente generosa, espírito educado nos mais severos princípios de religião. O Major Mathias exerce a caridade com os desvalidos com o mesmo fervor e sinceridade com que observa os preceitos da Igreja, etc.”
Exerceu o Major o cargo de Provedor desta Casa por 23 anos. Sucede-lhe em 1874 o Vigário José Theophilo Moinhos de Vilhena e logo realiza uma viagem de caridade como narra o mesmo Monitor Sul Mineiro: “Em excursão pela comarca esmolando em benefício de órfãos que deseja recolher a esta Santa Casa e que logo aqui foram abrigados”.
Ao Vigário Theófilo sucede Monsenhor Paulo Emílio Moinhos de Vilhena que a reergue e engrandece por um quarto de século, conseguindo que a viessem dirigir as beneméritas filhas de São Vicente de Paulo, conforme o assinalamos e hoje sob a direção modelar de uma delas Mère Ana Maria e, só contava então com as contribuições particulares e concessões esporádicas e aleatórias da assembléia estadual. Assim era antigamente mas isto não impedia que ela vivesse e prosperasse sob a vigilante contabilidade de seus Provedores e as esmolas de gente pobre de uma cidade onde rareavam pessoas de maiores recursos. Com razão perguntava Louis Veillot “Que seria dos pobres se não fossem os pobres!”.
São 119 anos durante os quais membros de uma mesma família, com o pequeno hiato de tempo assinalado acima, ininterruptamente tomaram a si o encargo de sua Provedoria.
De quando em vez promovíamos, eu e minha Senhora, pequenas festividades em benefício desta casa de caridade no confortável teatro da cidade, reliquatainda de seus áureos tempos e às quais nunca faltou o concurso de Senhoras e Senhoritas de nossa sociedade; o da magnífica orquestra Pompeu e o do povo tão bom quão generoso.
Aqui, Senhoras e Senhores – embevecido, absorto pelo encanto dessas recordações fui levado muito além do que seria lícito esperar de vossa paciência; mas desse quase êxtase sou arrancado pela dureza de um prolóquio que me convida a interromper tão extensa loquela lembrando-me a necessidade de ser breve para agradar: est brevis et placebis: sê breve e agradarás.
Sejam então, prezados amigos e conterrâneos, minhas últimas palavras um agradecimento comovido e sincero pela oportunidade que me foi dada de rever tão amado berço e a honra de paraninfar, sob a presidência de S. Exa. Revma. Sr. Bispo Diocesano, a inauguração desta nova Maternidade que traz seu seio, não fora ela uma Maternidade, prenhe de esperanças e promessas de grandes benefícios a serem prestados à população pelas caridosas irmãs vicentinas e pelos inteligentes e dedicados colegas que lhe estão e os que, de futuro, vierem ficar a frente de seus serviços.
Senhoras e Senhores, diz-se que Deus paga em dobro o que se faz por Seu amor. Se algo fiz por esta Santa Casa me sinto regiamente pago pela honra de paraninfar esta solenidade, como disse, e por uma mensagem que recebi quando daqui me ausentei e que nunca me foi dada oportunidade de agradecê-la de público, como ora faço, no desempenho de imperioso dever pedindo licença para aqui reproduzir dois parágrafos da mesma e não por orgulho mas para que os presente possam sentir até onde chega a generosidade de Deus, a que de início me referi e a bondade, a fidalguia de uma centena de campanhenses que, então, a subscreveram:
Reza essa mensagem:
Sr. Dr. Rodolpho Vilhena
“O renome que desinteressadamente emprestastes à sala de operações do hospital da Santa Casa, lá ficará como uma baliza gloriosa de vossa passagem e nobre estímulo e grande exemplo para vossos colegas.”
“Remediados e desvalidos hão de guardar a mais grata recordação de vosso vulto porque éreis junto deles a figura elevada e querida do desvelo, do carinho e do empenho e já não tanto por ver triunfar a ciência da Medicina ou a técnica da Cirurgia mas por vê-los sadios e restituídos ao seio da sociedade.”

Álvaro Araújo - Provedor

Muitos dos subscritores desta mensagem já terão falecido; aos sobreviventes e aos descendentes dos que já se foram e descansam no seio de Deus, a imperecível gratidão de quem apenas lhes pode redarguir: mil vezes obrigado.
Tenho dito.
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DR RODOLPHO VILHENA DE MORAIS

DR. RODOLPHO VILHENA DE MORAIS
Oriundo de tradicional e ilustre família campanhense, nasceu na Campanha em (?), filho legítimo do Prof. José Gomes de Morais e de D. Eugênia Augusta de Morais. Fez seus estudos iniciais na terra natal e os secundários no tradicional Colégio Anchieta, dos Jesuítas de Nova Friburgo, Estado do Rio de Janeiro, sendo o orador da sua turma, ocasião em que proferiu bela oração, publicada no Jornal do Comércio do Rio de Janeiro e de sua cidade natal. Matriculou-se, em seguida, na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, na qual se formou em 1912, defendendo tese doutoral, intitulada: “Da Prognose dos Tuberculosos”, aprovada com distinção.
Ingressou no Hospital de São João de Deus, da Real Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência, sendo ex-interno da Segunda Enfermaria de Clínica Médica da Santa Casa de Misericórdia, a cargo do emérito Prof. Rocha Faria e Prof. Extraordinário de Matemática do Colégio D. Pedro II. Retornou, passado algum tempo, à terra natal, onde clinicou e exerceu a cirurgia, com rara eficiência e grande brilhantismo. Foi médico do Colégio N. S. de Sion, da Santa Casa de Misericórdia e da Companhia Xicão de Mineração, sob a direção dos ilustres engenheiros franceses, Drs. Proust, Declou e Briguet, sendo o primeiro sofrido a amputação de uma perna, em conseqüência de um desastre ocorrido com um trole. Clinicou, ainda, em outras cidades, como Ribeirão Preto em São Paulo e Passos em Minas Gerais, deixando alto conceito de profissional de douto nível e cidadão de grandes virtudes e conceitos. Regressou ao Rio de Janeiro em 1930, exercendo nessa capital intensa atividade, não só como médico experimentado e professor eficiente e de elevada competência, como também jornalista, escritor e poeta. Colaborou, assim, em revistas médicas e jornais diversos, como o grande “Jornal do Comércio” e na revista “Pantiatra”, que fundou.
Publicou muitos livros de cunho científico e literário, tais como “Chamados de Urgência”(Diagnóstico/Tratamento), em 3ª edição, “Cardiopatas e Cardiopatias”, em 1938.“Tratamento das Varizes e Hemorróidas pelas Injeções Esclerosantes”, em 1937, em 2ª edição, “Epilepsia e seu Tratamento”, “Diagnose e Laboratório”, em 1944. Era também escritor, ensaísta e biógrafo, tendo publicado um excelente trabalho sobre o seu conterrâneo e grande sábio, Vital Brazil Mineiro da Campanha. Editou, também, a novela “Sangue Ariano”.
Antes de falecer, demonstrando grande amor à sua Campanha, fez doação de toda a sua valiosa biblioteca, composta de 1078 volumes, que hoje integra o rico acervo da biblioteca local, Padre Victor, o santo padre negro campanhense de alma de arminho. Faleceu o Dr. Rodolpho Vilhena de Morais, em (?),sem descendentes.